Trago na memória e
no coração os ensinamentos de meus pais, em tempo de criança: "peça a
bênção!"; "não avance na comida"; "agradeça o moço!";
"espere que lhe ofereçam as coisas!"; "fale mais baixo!"
Sim, as normas mais simples de boa educação vêm do berço, vistas mais no
exemplo do que ouvidas em discursos! São dignas de reconhecimento as famílias
que ensinam os caminhos do bem, cuidam que seus filhos tenham civilidade no
trato e edifiquem com seu comportamento o corpo social. Civilidade, bons modos
e etiqueta ainda estão na moda!
A Sagrada Escritura, no Antigo Testamento, é
como um grande código de comportamento, no qual entram noções de saúde pessoal
e pública, normas de respeito mútuo, leis sobre a organização das cidades ou
outras agregações, respeito à terra e aos ritmos da natureza. Os povos da
primitiva aliança tinham um só livro a que se referir, nele encontrando a
vontade de Deus, na qual está incluído o bem estar das pessoas. Nele deviam
encontrar o equilíbrio nas relações sociais e os limites no trato com os
outros. E não era um povo tranquilo e parado! Era gente de temperamento forte,
povo briguento ao enfrentar os que lhe eram ameaçadores. Deus teve paciência de
pai e ternura de mãe para cuidar daquele povo de cabeça dura! Sua história é um
processo de educação desenvolvido por Deus com infinita paciência.
A plenitude dos
tempos acontece com a encarnação do Verbo de Deus. Tornou-se o Senhor igual a nós
em tudo, menos no pecado. Assumiu tudo o que é nosso, para nos resgatar. Ele
chamou homens e mulheres, educou-os com delicadeza e firmeza. Os textos do Novo
Testamento são a narrativa da magnífica aventura de amor, na qual se compromete
a Trindade Santa e as pessoas destinadas a vida em comunhão com Deus e entre
elas mesmas. Passam os séculos, a sociedade enfrenta por muitas mudanças, a Boa
Notícia deve ser levada aos confins da terra, pelo anúncio e realização da
salvação em Jesus Cristo, Filho de Deus. A quais povos há de chegar? Ninguém
fica excluído! E a mesma estrada, conduzida pela pedagogia divina, há de ser
continuamente atualizada. Estamos numa escola de formação, desafiados a
experimentar aqui na terra o estilo de vida próprio do Céu. E não será menos
humano viver do jeito de Deus, pois ninguém entende mais de humanidade do que
quem a criou.
Jesus empreende
uma intensa jornada de formação com seus discípulos, sem desprezar qualquer
oportunidade. Certa feita, a ânsia pelos primeiros lugares numa refeição
festiva - falta de educação! - suscita o ensinamento do Senhor (Lc 14,1.7-14).
Jesus é observado por todos. Olhares diferentes, alguns mais curiosos do que
piedosos, outros com coração de crianças que querem aprender. A lição é mais do
que uma norma de civilidade, mas parte dela. Discrição, prudência no
relacionamento com os outros, delicadeza, sentar-se "no último
lugar". O que vai além das normas de etiqueta é o coração daquele que se
faz discípulo de Cristo. Sua meta é amar a servir, mais do que competir por
posições no concerto da sociedade. Olha ao seu redor, reconhece o valor dos
outros, toma a iniciativa do amor, sempre disposto a cumprimentar primeiro,
vencer o fechamento, ouvir e servir. Não se trata de humilhação, mas de
humildade, na qual se estabelece, no correr do tempo, uma sadia competição, na
qual todos têm como objetivo comum o serviço mútuo. Todos serão importantes,
porque ninguém quer ser maior do que outro, mas deseja ser "suporte"
para que todos cresçam.
A quem considera
superada ou irreal tal modo de agir, permito-me desafiar a fazer a experiência!
Tenho a certeza de que vai mudar alguma coisa, e muito, quando se transformarem
as relações entre as pessoas. Afinal de contas, não é difícil perceber que
multiplicamos as indelicadezas e agressões em escala cada vez maior. Os
conflitos existentes, inclusive os que depois chamamos de guerras, são escalas
mais amplas do mesmo egoísmo do dia a dia. A sociedade sofre as consequências
do que lhe pareceu condição de crescimento, a competição desenfreada, onde vale
a destruição recíproca dos que entram no jogo. Somos como que crianças grandes
que se esqueceram das lições de casa, com os riscos de destruir o grande
brinquedo que a vida nos ofereceu.
As lições de
Jesus, na aparentemente ingênua proposta de vida nova, pedem um jeito novo de
fazer a festa da vida: “Quando ofereceres um almoço ou jantar, não convides
teus amigos, nem teus irmãos, nem teus parentes, nem teus vizinhos ricos. Pois
estes podem te convidar por sua vez, e isto já será a tua recompensa. Pelo
contrário, quando deres um banquete, convida os pobres, os aleijados, os coxos,
os cegos! Então serás feliz, pois estes não têm como te retribuir! Receberás a
recompensa na ressurreição dos justos” (Lc 14,12-14).
Para praticá-las,
não há outra estrada senão rever os objetivos com os quais nos colocamos diante
das pessoas, valorizando-as mais do que os eventuais proveitos ou lucros que
possam oferecer. Elas valem antes e mais do que mostra sua aparência externa.
Do coração de quem tem fé brotarão os sentimentos e a prática da misericórdia e
da atenção, o cuidado e o serviço. Ninguém se cansará de ser assim "bem
educado".
Só com a graça de Deus poderemos alcançar tal
mudança na sociedade. Por isso pedimos: "Deus do universo, fonte de todo
bem, derramai em nossos corações o vosso amor e estreitai os laços que nos unem
convosco, para alimentar em nós o que é bom e guardar com solicitude o que nos
destes".
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo Metropolitano de Belém